quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Guerra às drogas encarcera mais negros do que apartheid - Maria Lucia Karam



A juíza aposentada do Rio de Janeiro, Maria Lucia Karam, afirma que a criminalização do usuário que ainda persiste no Brasil viola declarações internacionais e e a própria Constituição brasileira. Karam faz parte da Apilcação da Lei contra a Proibição (Leap, na sigla em inglês). Segundo a juíza, a guerra às drogas nos EUA - que serve de referência para outros países - já propicia um quadro de encarceramento da população negra que ultrapassa os indíces do regime do apartheid na África do Sul.

Judicialmente, o usuário de drogas ainda é tratado como criminoso? Na sua opinião, quais mudanças na legislação poderiam tornar o relacionamento do judiciário com o usuário mais humano?

Maria Lucia Karam: Sim, o usuário de drogas ilícitas ainda é tratado como criminoso no Brasil. A Lei 11.343/2006 – a vigente lei brasileira em matéria de drogas – ilegitimamente criminaliza a posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas em seu artigo 28, ali prevendo penas de advertência, prestação de serviços à comunidade, comparecimento a programa ou curso educativo e, em caso de descumprimento, admoestação e multa. A Lei 11.343/2006 apenas afastou a previsão de pena privativa de liberdade.
Não se trata de tornar o relacionamento do Poder Judiciário com o usuário mais humano. Na realidade, o mero fato de usar drogas ilícitas não deveria levar ninguém a se relacionar com o Poder Judiciário. A criminalização da posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas viola princípios garantidores de direitos fundamentais inscritos nas declarações internacionais de direitos e nas constituições democráticas, aí naturalmente incluída a Constituição Federal brasileira. A simples posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas, ou seu consumo em circunstâncias que não envolvam um perigo concreto, direto e imediato para terceiros são condutas que dizem respeito unicamente ao indivíduo que as realiza, à sua liberdade, às suas opções pessoais. Condutas dessa natureza não podem sofrer nenhuma intervenção do Estado, não podem sofrer nenhuma sanção. Em uma democracia, a liberdade do indivíduo só pode sofrer restrições quando sua conduta atinja direta e concretamente direitos de terceiros.

A guerra às drogas tem um cunho social? Isto é, ela atinge majoritariamente os mais pobres? Se sim, a sra. considera que essa é uma estratégia pensada propositadamente para atingir os mais pobres?

A “guerra às drogas” não se dirige propriamente contra as drogas. Como qualquer outra guerra, dirige-se sim contra pessoas – nesse caso, os produtores, comerciantes e consumidores das drogas tornadas ilícitas. Como acontece com qualquer intervenção do sistema penal, os mais atingidos pela repressão são – e sempre serão – os mais vulneráveis econômica e socialmente, os desprovidos de riquezas, os desprovidos de poder.
No Brasil, os mais atingidos são os muitos meninos, que, sem oportunidades e sem perspectivas de uma vida melhor, são identificados como “traficantes”, morrendo e matando, envolvidos pela violência causada pela ilegalidade imposta ao mercado onde trabalham. Enfrentam a polícia nos confrontos regulares ou irregulares; enfrentam os delatores; enfrentam os concorrentes de seu negócio. Devem se mostrar corajosos; precisam assegurar seus lucros efêmeros, seus pequenos poderes, suas vidas. Não vivem muito e, logo, são substituídos por outros meninos igualmente sem esperanças. Os que sobrevivem, superlotam as prisões brasileiras.
Nos EUA, pesquisas apontam que, embora somente 13,5% de todos os usuários e “traficantes” de drogas naquele país sejam negros, 37% dos capturados por violação a leis de drogas são negros; 60% em prisões estaduais por crimes relacionados a drogas são negros; 81% dos acusados por violações a leis federais relativas a drogas são negros. Os EUA encarceram 1.009 pessoas por cem mil habitantes adultos. Se considerados os homens brancos, são 948 por cem mil habitantes adultos. Se considerados os homens negros, são 6.667 por cem mil habitantes. Sob o regime mais racista da história moderna, em 1993 – sob o apartheid na África do Sul – a proporção era de 851 negros encarcerados por cem mil habitantes. Como ressalta Jack A. Cole, diretor da Law Enforcement Against Prohibition-LEAP – organização internacional que reúne policiais, juízes, promotores, agentes penitenciários e da qual orgulhosamente faço parte – é o racismo que conduz a “guerra às drogas” nos EUA.
Na Europa, a mesma desproporção se manifesta em relação aos imigrantes vindos de países pobres.
A função da “guerra às drogas” – ou do sistema penal em geral – de criminalização dos mais vulneráveis e de conseqüente conservação e reprodução de estruturas de dominação não é exatamente uma estratégia pensada propositadamente pelo político A ou B; é sim algo inerente ao exercício do sempre violento, danoso e doloroso poder punitivo.

As experiências de legalização/descriminalização das drogas têm ajudado a diminuir a violência em função do tráfico?

As experiências menos repressivas na atualidade limitam-se à descriminalização da posse para uso pessoal das drogas tornadas ilícitas. A descriminalização da posse para uso pessoal das drogas ilícitas é um imperativo derivado da necessária observância dos princípios garantidores dos direitos fundamentais inscritos nas declarações internacionais de direitos e nas constituições democráticas. A posse de drogas para uso pessoal, como antes mencionado, é uma conduta que não atinge concretamente nenhum direito de terceiros e, portanto, não pode ser objeto de qualquer intervenção do Estado.
Mas essa imperativa descriminalização não é suficiente. Não haverá nenhuma mudança significativa, especialmente no que concerne à violência, a não ser que a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas possam se desenvolver em um ambiente de legalidade. Para afastar os riscos e os danos da proibição, para pôr fim à violência resultante da ilegalidade, é preciso legalizar a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas.
A legalização da produção e do comércio de todas as drogas afastará a violência que hoje acompanha tais atividades, pois essa violência só se faz presente porque o mercado é ilegal. ão são as drogas que causam violência. A produção e o comércio de drogas não são atividades violentas em si mesmas. É a ilegalidade que cria a violência. A produção e o comércio de drogas só se fazem acompanhar de armas e de violência quando se desenvolvem em um mercado ilegal. A violência não provem apenas dos enfrentamentos com as forças policiais, da impossibilidade de resolução legal dos conflitos, ou do estímulo à circulação de armas. Além disso, há a diferenciação, o estigma, a demonização, a hostilidade, a exclusão, derivados da própria ideia de crime, a sempre gerar violência, seja da parte de agentes policiais, seja da parte daqueles a quem é atribuído o papel do “criminoso” – ou pior, do “inimigo”.
A produção e o comércio de álcool ou de tabaco se desenvolvem sem violência – disputas de mercado, cobranças de dívidas, tudo se faz sem violência. Por que é diferente na produção e no comércio de maconha ou cocaína? A óbvia diferença está na proibição, na irracional política antidrogas, na insana e sanguinária “guerra às drogas”.
Aliás, o exemplo de legalização que podemos invocar é o que ocorreu nos EUA na década de 1930, com o fim da proibição do álcool. O proibicionismo produziu e inseriu no mercado produtor e distribuidor do álcool empresas criminalizadas; fortaleceu a máfia de Al Capone e seus companheiros; provocou a violência que caracterizou especialmente a cidade de Chicago daquele tempo. Com o fim da chamada Lei Seca (o Volstead Act), o mercado do álcool se normalizou e aquela violência que o cercava simplesmente desapareceu.

Material obtido no site: Legalize Boldo

terça-feira, 14 de dezembro de 2010


10 razões para legalizar as drogas

O texto abaixo, publicado no Le Monde Diplomadique Brasil de setembro/2009, foi escrito por um membro da Inteligência Criminal da Scotland Yard e desenvolve de maneira bem clara os motivos que fazem da legalização das drogas uma necessidade gritante para a sociedade de hoje, e que sempre esbarra em preconceitos e falta de informação. Leitura simples e fundamental para embasar os argumentos de quem sabe que a legalização é a única ação capaz de mudar o impacto negativo resultante do tráfico em nossa sociedade.

10 razões para legalizar as drogas
por John Grieve

1 – ENCARAR O VERDADEIRO PROBLEMA
Os burocratas que constroem as políticas sobre drogas têm usado a proibição como uma cortina de fumaça para evitar encarar os fatores sociais e econômicos que levam as pessoas a usar drogas. A maior parte do uso ilegal e do uso legal de drogas é recreacional. A pobreza e o desespero estão na raiz da maioria do uso problemático da droga, e somente dirigindo-se a estas causas fundamentais é que poderemos esperar diminuir significativamente o número de usuários problemáticos.

2 – ELIMINAR O MERCADO DO TRÁFICO
O mercado de drogas é comandado pela demanda e milhões de pessoas demandam drogas atualmente ilegais. Se a produção, suprimento e uso de algumas drogas são criminalizados, cria-se um vazio que é preenchido pelo crime organizado. Os lucros neste mercado são de bilhões de dólares. A legalização força o crime organizado a sair do comércio de drogas, acaba com sua renda e permite-nos regular e controlar o mercado (isto é prescrever, licenciar, controle de venda a menores, regulação de propaganda, etc..).

3 – REDUÇÃO DRÁSTICA DO CRIME
O preço de drogas ilegais é determinado por um mercado de alta demanda e não regulado. Usar drogas ilegais é muito caro. Isto significa que alguns usuários dependentes recorrem ao roubo para conseguir dinheiro (corresponde a 50% do crime contra a propriedade na Inglaterra e é estimado em 5 bilhões de dólares por ano). A maioria da violência associada com o negócio ilegal da droga é causada por sua ilegalidade. A legalização permitiria regular o mercado e determinar um preço muito mais baixo acabando com a necessidade dos usuários de roubar para conseguir dinheiro.Nosso sistema judiciário seria aliviado e o número de pessoas em prisões seria reduzido drasticamente, economizando-se bilhões de dólares. Por causa do preço baixo, os fumantes de cigarro não têm que roubar para manter seu hábito. Não há também violência associada com o mercado de tabaco legal.

4 – USUÁRIOS DE DROGA ESTÃO AUMENTANDO
As pesquisas na Inglaterra mostram que quase a metade de todos os adolescentes entre 15 e 16 anos já usou uma droga ilegal. Cerca de 1,5 milhão de pessoas usa ecstasy todo fim de semana. Entre os jovens, o uso ilegal da droga é visto como normal. Intensificar a guerra contra as drogas não está reduzindo a demanda. Na Holanda, onde as leis do uso da maconha são muito menos repressivas, o seu uso entre os jovens é o mais baixo da Europa. A legalização aceita que o uso da droga é normal e que é uma questão social e não uma questão de justiça criminal. Cabe a nós decidirmos como vamos lidar com isto. Em 1970, na Inglaterra, havia 9.000 condenações ou advertências por uso de droga e 15% de novas pessoas tinham usado uma droga ilegal. Em 1995 os números eram de 94.000 e 45%. A proibição não funciona.

5 – POSSIBILITAR O ACESSO A INFORMAÇÃO VERDADEIRA E A RIQUEZA DA EDUCAÇÃO
Um mundo de desinformação sobre drogas e uso de drogas é engendrado pelos ignorantes e preconceituosos burocratas da política e por alguns meios de comunicação que vendem mitos e mentiras para benefício próprio. Isto cria muito dos riscos e dos perigos associados com o uso de drogas. A legalização ajudaria a disseminar informação aberta, honesta e verdadeira aos usuários e aos não-usuários para ajudar-lhes a tomar decisões de usar ou não usar e de como usar. Poderíamos começar a pesquisar novamente as drogas atualmente ilícitas e descobrir todos seus usos e efeitos – positivos e negativos.

6 – TORNAR O USO MAIS SEGURO PARA O USUÁRIO
A proibição conduziu à estigmatização e marginalização dos usuários de drogas. Os países que adotam políticas ultra-proibicionistas têm taxas muito elevadas de infecção por HIV entre usuários de drogas injetáveis. As taxas de hepatite C entre os usuários no Reino Unido estão aumentando substancialmente. No Reino Unido, nos anos 80, agulhas limpas para usuários e instrução sobre sexo seguro para jovens foram disponibilizados em resposta ao medo do HIV. As políticas de redução de danos estão em oposição direta às leis de proibição.

7 – RESTAURAR NOSSOS DIREITOS E RESPONSABILIDADES
A proibição criminaliza desnecessariamente milhões de pessoas que, não fosse isso, seriam pessoas normalmente obedientes às leis. A proibição tira das mãos dos que constroem as políticas públicas a responsabilidade da distribuição de drogas que circulam no mercado paralelo e transfere este poder na maioria das vezes para traficantes violentos. A legalização restauraria o direito de se usar drogas responsavelmente e permitiria o controle e regulação para proteger os mais vulneráveis.

8 – RAÇA E DROGAS
As pessoas da raça negra correm dez vezes mais risco de serem presas por uso de drogas que as pessoas brancas. As prisões por uso de droga são notoriamente discriminatórias do ponto de vista social, alvejando facilmente um grupo étnico particular. A proibição promoveu este estereótipo das pessoas negras. A legalização remove um conjunto inteiro de leis que são usadas desproporcionalmente no contato de pessoas negras com o sistema criminal da justiça. Ajudaria a reverter o número desproporcional de pessoas negras condenadas por uso de droga nas prisões.

9 – IMPLICAÇÕES GLOBAIS
O mercado de drogas ilegais representa cerca de 8% de todo o comércio mundial (em torno de 600 bilhões de dólares ano). Países inteiros são comandados sob a influência, que corrompe, dos cartéis das drogas. A proibição permite também que os países desenvolvidos mantenham um amplo poder político sobre as nações que são produtoras com o patrocínio de programas de controle das drogas. A legalização devolveria o dinheiro perdido para a economia formal, gerando impostos, e diminuiria o alto nível de corrupção. Removeria também uma ferramenta de interferência política das nações estrangeiras sobre as nações produtoras.

10 – A PROIBIÇÃO NÃO FUNCIONA
Não existe nenhuma evidência para mostrar que a proibição esteja resolvendo o problema. A pergunta que devemos nos fazer é: Quais são os benefícios de criminalizar qualquer droga? Se após analisarmos todas as evidências disponíveis concluirmos que os males superam os benefícios, então temos de procurar uma política alternativa. A legalização não é a cura para tudo, mas nos permite encarar os problemas criados com o uso da droga e os problemas criados pela proibição. É chegada a hora de uma política pragmática e eficaz sobre drogas.

http://diplomatique.uol.com.br/editorial.php?edicao=2

Material obtido no site: Legalize o Boldo

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Libere Já! - Juiz Siro Darlan


Entrevista concedida à Rádio Manchete (17/12/2009).

Especialista no atendimento e proteção de crianças e adolescentes, o Desembargador Siro Darlan fala à Rádio Manchete sobre um dos temas mais controversos do combate às drogas: a descriminalização controlada dos entorpecentes.

Drogas. Elas estão inseridas em todas as camadas da sociedade. Não há predominância de idade, cor, raça ou nacionalidade. São consumidas sem limites, gerando lucros milionários, guerras sem fim, mortes inocentes e o total abandono da cidadania. Mas de quem é a culpa? Dos usuários, pois sem consumo não há venda? Dos traficantes que comandam o mercado de entorpecentes? Da polícia, ineficaz na repressão? Dos líderes mundiais, incapazes de eliminar essa epidemia respeitando os limites da diplomacia? Dos sul-americanos no comércio da “branca colombiana”, como a cocaína é chamada? Dos afegãos, pois o ópio produzido lá mata 100 mil pessoas ao ano? Dos americanos que fizeram da heroína vietnamita o combustível para soldados suportarem o horror dos campos de batalha? Desde a década de 1950 não se fez muita coisa a não ser discutir de quem é a culpa pela disseminação das drogas. Poucos ousaram ou tiveram inteligência para apresentar soluções cabíveis. E já não é pequeno o movimento daqueles que defendem a liberalização das drogas como o começo de uma possível salvação. Políticos, artistas e autoridades levantam cada vez mais a bandeira da descriminalização dos entorpecentes. O Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Siro Darlan, é uma dessas pessoas. Ex-titular da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso, Darlan é cauteloso quando diz que a possibilidade de liberar o consumo de drogas precisa ser bastante debatida antes de tomar forma. Porém, para justificar sua posição, apresenta argumentos embasados na experiência de quem trabalha há anos no combate à erradicação da pobreza, das desigualdades, da criminalidade, e, em especial, da melhoria das condições de vida de crianças e adolescentes. Diz que nunca usou drogas, “embora tivesse tido acesso quando estudante”, mas credita à educação e informação o fato de ter passado longe do vício. Siro Darlan sabe que não há mais tempo a perder. Algo precisa ser feito. “Eu não estou propondo apologia às drogas. Estou propondo uma maneira eficiente de combater as drogas”. Como? É o que você confere a seguir:

A proibição do consumo de drogas aumenta a violência?
Os oficiais da Polícia Militar foram fazer um curso de guerrilha na Colômbia. Então isso demonstra que nós estamos num estado de guerra. Isso alimenta o interesse deliberante na manutenção da proibição. E essa proibição alimenta a terceira maior economia do planeta, que é das drogas. E por que nessa economia circula tanto dinheiro, tantos recursos? Por causa da proibição. Os EUA mantêm suas guerras à custa de drogas. No Vietnã os veteranos de guerra voltaram viciados porque o próprio exército americano alimentou a tropa com heroína, ópio e cocaína pra aguentar o combate. Então é hipócrita essa luta contra as drogas, que resulta na morte de tantas pessoas inocentes.

Então o senhor acredita que a guerra armada contra o tráfico não é o melhor caminho?
No que resulta essa guerra que está aí? Primeiro em uma das maiores máquinas de corrupção do planeta. O bandido corrompe a polícia, a polícia corrompe a justiça. Então há uma sociedade corrompida pelo interesse econômico das drogas. Observe o que aconteceu nos EUA na década de 1930, quando era proibido o consumo de bebidas alcoólicas. Com a legalização do uso do álcool, as primeiras grandes vítimas foram os gângsteres americanos. A primeira consequência da legalização das drogas será desempregar todos os traficantes. Hoje 80% das cadeias do Rio de Janeiro são ocupadas por traficantes. Se você legaliza, você direciona melhor o dinheiro que a sociedade paga para manter na ociosidade 22 mil presos em razão das drogas.

Mas a liberação não poderia incentivar o consumo?
Oficializando-se a venda de drogas através de drogarias, você pode controlar o consumo e criar tributos para um fundo direcionado para educação e tratamento dos usuários de drogas. Você vai trabalhar na prevenção, impedindo que as pessoas se viciem, porque as pessoas se viciam geralmente por falta de informação dos malefícios das drogas. E o que a proibição gera? A busca da viagem proibida. O que a sexualidade irresponsável gera? Gravidez prematura e doenças contagiosas. Uma pessoa que discute o sexo na família, na escola, vai usar o sexo de maneira sadia. Uma pessoa que tiver a informação sobre os malefícios da droga vai evitar usar drogas. E isso é tão verdade que hoje no Brasil, um país tabagista, as pessoas estão deixando de fumar cigarro pela educação.

Recentemente o senhor justificou sua posição em um artigo do Jornal do Brasil citando que o país tem a quarta maior população carcerária do mundo. Ou seja, apenas a repressão não está melhorando a situação?
Essa repressão é promovida pela proibição. E mesmo com toda essa proibição há quarenta anos nos EUA usavam-se muito menos drogas do que se usa hoje, e naquela época a droga era muito mais barata. É uma questão de mercado. Demonstra que a proibição estimula o uso de drogas. Nos países onde houve a liberalização controlada de drogas teve redução significativa de mortes por overdoses, redução da corrupção e de usuários de drogas, exceto maconha.

O senhor não teme que a liberação deixe o mercado das drogas ainda mais acirrado e continue provocando guerras entre facções rivais?
Como foi que o governo combateu o jogo? Oficializando o jogo. Hoje quem é o maior banqueiro de bicho do Brasil? A Caixa Econômica Federal. O que nós tínhamos antes? Bicheiro matando bicheiro. Hoje nós não temos mais isso. Os últimos bicheiros que matavam bicheiros foi a geração que sucedeu o Castor de Andrade. O governo bancou o jogo. Se o governo bancar o controle e o comércio dos narcóticos vai arrecadar uma carga tributária enorme, assim como arrecada no álcool e no fumo. O governo vai poder direcionar essa carga para tratamento e prevenção do uso de drogas. Está provado para todo mundo que um país se desenvolve pela educação e não pela repressão. Todos os Tigres Asiáticos que investiram em educação cresceram e se desenvolveram. Por que o nosso país é pobre economicamente? Porque não investe em educação. Eu não estou propondo apologia às drogas. Pelo contrário. Estou propondo uma maneira eficiente de combater as drogas.

Como funcionaria a liberação? Como seria a dinâmica dessa situação?
A idéia parece piada, mas é criar uma “Drogasbrás”. Ou seja, criar um instituto vinculado ao Ministério da Educação em que o próprio governo controle a venda, e que ela seja feita através de prescrições em farmácia e drogarias. A própria palavra fala. Drogarias. Inclusive nós já compramos drogas em drogarias, drogas proibidas, pois há aquelas que só podem ser obtidas com prescrição de tarja preta passada pelo médico. É um mercado.

O senhor já experimentou drogas?
Eu nunca quis, nunca experimentei. Embora tivesse acesso como estudante. Nunca penso experimentar porque eu tenho a real consciência dos malefícios das drogas.

Se um filho seu quiser experimentar?
Eu vou falar com ele, vou mostrar para ele os malefícios que a droga faz, vou apontar os caminhos certos, instruí-lo pedagogicamente e educar para que ele evite drogas, álcool e cigarros. Tenho consciência dos malefícios destas substancias.

Usuários que possuem dinheiro suficiente poderão comprar drogas controladas nos estabelecimentos autorizados, mas a classe mais pobre não vai continuar comprando drogas de traficantes nos morros?
Isso é inevitável. Isso vai acontecer, porque hoje você compra um CD na loja por R$ 40 e no camelô por R$ 5. Mas isso não é resultado da proibição, é consequência do mercado capitalista e consumidor.

Uma pesquisa divulgada pela secretaria Municipal de Assistência Social constatou que 80,9% dos quase 800 meninos de rua consomem crack. Sendo que em 2005 era de 13%. Houve uma substituição da cola de sapateiro pela pedra de crack. Qual a sua avaliação sobre essa epidemia de crack na cidade do Rio de Janeiro?
O consumo de crack não é resultado do preço ou da proibição, mas sim de políticas públicas. É preciso ter recursos direcionados dos orçamentos para tratar melhor essas crianças, que estão usando crack porque têm fome. Crack engana o estômago, como o álcool. O erro não é 80% usarem crack. O erro é ter população de rua. E por que tem? Porque não há políticas públicas de apoio às famílias e de valorização da educação.

Em quanto tempo seria possível levar adiante essa dinâmica de legalizar as drogas?
Quando eu falo em legalização eu não falo de um dia para o outro baixar um decreto. Isso tem que se discutir nas Universidades e com a saúde pública.

Que resposta o senhor dá àqueles que dizem que defender a legalização é apologia ao crime?
Eu não defendo nem a droga, nem o consumo e nem faço apologia. Minha proposta é contra as drogas e contra também a hipocrisia da proibição. Eu sou contra a violência no combate às drogas. Violência não resolve nada. Eu sou à favor do combate às drogas através de processos educacionais. Nós temos no Brasil, reconhecido no mundo inteiro, o melhor programa de combate às consequências do HIV. Fizemos o melhor programa de prevenção ao vírus, copiado no mundo inteiro. Dizem que o Brasil não está preparado para isso. Como não? O Brasil dá exemplos de eficiência em muitos programas.

Como funcionaria a sua sugestão de liberação dos presos sentenciados por crimes de drogas leves?
É uma consequência da legalização se houvesse um decreto ou lei declarando que a venda de drogas deixa de ser crime. Aqueles que cometeram outros crimes em razão da guerra das drogas, é que terão que responder por eles.

Mas haveria necessidade de acompanhamento destes ex-detentos?
No começo seria um pouco caótico, mas você criaria um programa e aproveitamento dessa população carcerária em trabalhos comunitários. Aliás, nos EUA tem um programa bem interessante em que o juiz negocia com os traficantes, aqueles que foram condenados, e substitui a pena privativa de liberdade pela obrigação de fazer um tratamento. Você assina um termo e é monitorado. Tem que fazer coleta de urina para provar que não está usando droga. Isso é melhor do que deixar uma pessoa na ociosidade durante sete anos e, de repente, colocar na rua quando ela não tem mais valor moral nenhum.

Há uns cinco anos atrás nós não víamos tantos menores se drogando com crack nas ruas. Esse problema está sendo importado de São Paulo? Foi falta de acompanhamento do Estado? A que o senhor atribui isso?
O crack foi uma negociação de mercado. Isso é de conhecimento público. Enquanto interessava ao mercado das drogas que o crack não entrasse aqui no Rio, porque era uma droga barata, não entrou. Não foi porque a polícia foi eficiente. Foi porque os traficantes decidiram que o crack não entraria no Rio de Janeiro. Quando esse acordo foi rompido, quando começou a política de enfrentamento, o mercado viu-se cercado para acessar as drogas mais tradicionais e se abriu para as mais baratas. O crack é ainda mais barato que a cola de sapateiro. E mais devastador.

Foto: ALERJ

Drogas: mudei de opinião - Coronel Jorge da Silva

Nos meus tempos de Polícia Militar, achava que os usuários de drogas deveriam ser reprimidos com o mesmo rigor que os traficantes. Já no final da carreira, tinha minhas dúvidas. Ora, por mais que os governos e a polícia se empenhassem (até as Forças Armadas foram empregadas no Rio de Janeiro), nada mudava, ou melhor, mudava para pior: mais traficantes, mais usuários, mais tiroteios, mais mortes, mais comunidades subjugadas por “comandos”, mais assaltos, mais “bondes” do mal em túneis e vias expressas. Na verdade, o que fazíamos, ou melhor, o que fazemos não passa de um constante “enxugar gelo”, expressão que utilizei em texto que escrevi há mais de 15 anos.

Depois, confundindo usuários com dependentes, achei que os usuários necessitavam de cuidados médicos. Mais tarde, que só dependentes, e não usuários, careciam desses cuidados. Também sustentava que o álcool, que consumia e consumo, não era prejudicial se tomado com moderação, ao contrário da cocaína e da maconha, drogas que, para mim, eram coisas do demo, caminho inevitável para a degradação moral e mesmo para a morte.

Incomodavam-me as campanhas pela descriminalização, legalização etc., por dois motivos: primeiro, porque via nos discursos públicos dos seus defensores um incentivo ao consumo; e, segundo, porque temia, em caso de a liberalização efetivar-se, que houvesse uma corrida desenfreada às drogas. Ficava imaginando pessoas tomadas pelo vício, trôpegas, olhos vermelhos, caídas pelas calçadas (aliás, como vemos muitos dependentes do álcool…).

Nas campanhas antidrogas, não entendia que, ao mesmo tempo em que se falava em caminho sem volta, apresentavam-se pessoas que tinham, como diz o chavão, chegado ao fundo do poço, mas que de lá tinham voltado, tornando-se pessoas produtivas, exemplos de cidadania. Ora, concluiria um jovem usuário: “Se é assim, quando eu quiser, paro”.

Chegam notícias de que em vários países, inclusive num dos mais repressivistas deles, os Estados Unidos, tem havido descriminalização do consumo, sobretudo da maconha, isentando de pena o usuário. E um dos meus temores diminuiu quando soube do que aconteceu em Portugal.

Em 2001, depois de muita polêmica, o parlamento português aprovou lei que descriminalizou o consumo e a posse para uso próprio de pequenas quantidades, não só de maconha, mas de todas as drogas. Como era de se esperar, houve protestos de toda parte, a maioria das pessoas acreditando que o consumo aumentaria de forma exponencial e que Portugal se transformaria num centro de viciados de toda a Europa.

Não foi o que aconteceu. Estudos recentes, inclusive do Escritório de Drogas e Crime das Nações Unidas (UNODC) revelaram que o consumo de maconha e cocaína diminuiu, sobretudo entre os jovens, e que o temor de que o País se transformaria num paraíso das drogas era um exagero.

Tendo em vista que o objetivo da governança global com a “guerra às drogas” era chegar a um “mundo sem drogas, e que esse objetivo, antes de ser uma utopia, é redonda insensatez; e tendo em vista ainda os danos sociais resultantes da “guerra”, mudei de idéia em relação aos meus tempos de PM: as drogas (ilícitas e lícitas) são uma questão social importante, e não “caso de polícia”. Para começar, faço coro com aqueles que, no Brasil, advogam em favor da descriminalização do consumo da maconha. Porém, por que não estudar melhor o modelo português?

Bem, e o que colocar no lugar da repressão? Prefiro uma combinação de educação, família, valores e tratamento para quem o desejar.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Convite



Para ler o convite vá até o link abaixo:

http://www.almadepoeta.com/chega_de_hipocrisia.htm

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

No Reino da Propaganda!


Foto: Henrique Esteves/Futura Press

Mais um dia normal na cidade do Rio de Janeiro. Entenda-se como normal aquilo que já se tornou comum, diário, na vida da população carioca: a guerra urbana e o descaso das autoridades para com as necessidades da população. Além da utilização do marketing, que tenta a todo custo tapar o sol com uma peneira de mentiras, veiculada por propagandas sedutoras, sejam elas de bebidas alcoólicas ou de puro marketing político.

Ligo a tevê e passo por 3 canais que transmitem a programação local, os RJs. O foco principal é mais um capítulo da novela real protagonizada pela centena de grupos fortemente armados (pistolas, fuzis, metralhadoras, armamento antiaéreo, granadas, ... , por enquanto) versus a polícia do estado e a população. O gozado é que esses confrontos, os mais graves, sempre acontecem quando um grupo tenta invadir a área de outro. Nos dias comuns, todas as bocas de crack e outras drogas ilegais mantêm-se em pleno funcionamento, raramente sendo incomodadas, o que nem sempre acontece com os dependentes, quando saem delas.

Continuando a passar a vista pelos mesmos canais vejo o drama da população humilde na porta de um hospital da Prefeitura. Um senhor de 76 anos diz que esperou mais de 10 horas na fila para pegar um número de consulta. Coisa bem diferente do que nos é mostrado nas propagandas políticas.

É nesse reino da propaganda onde vemos melhor a manipulação e a hipocrisia com que somos tratados. Na política o culto às grandes obras e eventos, como a Cidade da Música ou as Olimpíadas de 2016, que geram fotos, matérias na mídia, desviando a atenção das carências básicas e dificuldades que os brasileiros enfrentam. Na questão das drogas, a indústria do álcool, droga lícita, investindo pesado na ampliação dos seus negócios - a captação de dependentes - não respeita a idade de seus futuros clientes nem a saudável prática desportiva. Vejo isso como um insulto às vítimas, já que essa droga pesada mata e debilita muito mais pessoas do que todas as drogas ilícitas juntas. O que também acontece igualmente no combate a essas drogas.



Por outro lado a mídia não divulga que 146 projetos de lei tramitam simultaneamente na Câmara dos Deputados solicitando restrições à propaganda de bebidas alcoólicas, mas que não saem do lugar. Em outro ponto vemos que um acordo comercial, da Fifa com a indústria da bebida, fará com que afrouxemos nossas leis/regulamentações de restrição à venda de bebidas em estádios e cercanias, durante a Copa de 2014. O poder do dinheiro suplantando nossa soberania e ignorando o lado humano: o das vítimas e familiares dos que perderam a vida, direta ou indiretamente, por causa da bebida alcoólica.

Reparem que hoje eu não vou nem falar do patrocínio dos brahmeiros à seleção brasileira.

Se nosso povo fosse unido e organizado, como deveria ser, faria um boicote pesado às duas próximas Copas, África do Sul e Brasil, patrocinadas com o dinheiro desse entorpecente chamado álcool. Eu, por aqui, já estou boicotando.

Isso tudo fica parecendo papo de cidadão chato e indignado. Talvez certo esteja o ministro ao falar que o Rio não é uma cidade violenta. Na internet, logo abaixo da notícia sobre o novo combate em Vila Isabel, vemos os títulos de algumas matérias relacionadas, coisa de paranóicos cariocas, com mania de perseguição.

Obrigado,

Luiz Fernando Prôa


Leia mais:
- Milícias avançam sobre os morros e já dominam 41,5% das favelas cariocas, aponta Uerj;
- Operações da PM nos morros do Rio prendem 41 pessoas; 33 pessoas morreram;
- Der Spiegel: Brasil e África do Sul, sedes da Copa, usam táticas impiedosas contra o crime;
- Protesto no Rio pede identidade de mortos em conflitos; veja o vídeo;
- Parentes de jovens assassinados no morro dos Macacos vão mover ação contra o Estado;
- "Mexeram num vespeiro", diz morador da 'faixa de Gaza', Rio de Janeiro;
- "Cadê a inteligência da polícia?", questionam moradores da Vila Cruzeiro (RJ);
- El País: "Jornalista, para de tremer; se quiséssemos, você já estaria morto";
- Assimilamos níveis de barbárie cada vez maiores, diz especialista;
- Le Monde: Cenas de guerrilha urbana nas favelas do Rio;
- Especialistas destacam descaso de autoridades e fácil acesso às armas;
- "Favela é mais segura do que Copacabana", diz ex-chefe do tráfico, hoje no AfroReggae;
- No Rio, policial é treinado para se achar um justiceiro, diz coronel.
- Confrontos entre traficantes e policiais em morros do Rio (de janeiro a setembro) já deixaram 805 mortos.
- Zona Norte, do Rio, viveu momentos de guerra civil.
- RIO - Um intenso tiroteio entre traficantes dos morros da Formiga e Borel levou pânico aos moradores da Tijuca, Zona Norte, na madrugada de hoje.

domingo, 15 de novembro de 2009

A importância do grito Chega de Hipocrisia!


Gean Queiroz Clique: LFP

Nos últimos dias estive construindo a página no site e este blog, buscando dar visibilidade ao grito Chega de Hipocrisia! E nestes mesmos dias percebi o quanto ele é essencial. Um dos pontos importantes que focamos, em cima do qual iniciamos esta luta, é exatamente o esforço para retirar a propaganda de bebidas alcoólicas dos olhos e ouvidos de nossas crianças e jovens. Um adulto, com sua maturidade e informação, pode decidir que rumo tomar em sua vida. Contudo esperar que mentes em formação, massacradas pela lavagem cerebral de maciça propaganda, não sejam influenciadas e se transformem em lucro financeiro futuro das indústrias de bebidas é querer tampar o sol com uma agulha ou então pura hipocrisia.

Vejam com que me deparei nestes últimos 3 dias. Na quinta soube que a Copa terá um grupo cervejeiro como patrocinador. Na sexta, por curiosidade, recebi um e-mail e fui até o link sugerido, Prêmio Congresso em Foco. Ali se vota para escolher os melhores parlamentares do ano. Até aí nenhum problema, mas quando vi o patrocínio, Ambev (multinacional cervejeira) e Petrobras... No sábado só me restava relaxar após o almoço. Liguei a tevê para ver o jogo do Brasil, e quem estava lá além do Kaká e outros craques? O patrocinador, que não preciso dizer de qual indústria, pagando para vermos um ídolo do futebol bater no peito, enquanto a tradicional musiquinha tocava: eu sou bra...

Em falar em craque, que tal algum atleta bem intencionado, fazer uma campanha valorizando o craque que encanta, no lugar do crack que destrói, como bem disse meu amigo Sagara. Estaria prestando um grande serviço à nação.

Voltando à tevê: Desliguei-a após o comercial. Agora programa com propaganda de bebida na mesma hora eu desligo a telinha. Esse é meu protesto pessoal!

Como falei no início, a cada dia venho percebendo o quanto é essencial lutarmos contra esse surto de hipocrisia. De um lado os traficantes armados cuidando dos consumidores de drogas ilegais, quando deveria ser o governo e a sociedade a cuidar deles. De outro lado vemos a força de uma indústria bilionária com sua arma, o dinheiro. Manipulando através da propaganda toda uma geração de consumidores dessa droga pesada que é o álcool. Que destrói há décadas inúmeras vidas, diretas e indiretas, e é uma porta de entrada para o mundo das drogas ilegais, como se sabe, mas é legal. Melhor dizendo, lícita.

Não deixem de dar uma passada na página do Chega de Hipocrisia. Lá você pode ver algumas fotos da caminhada, ler depoimentos de famílias vítimas do crack e textos sobre drogas legais e ilegais, para se manter informado.

O link da página:
http://www.almadepoeta.com/chega_de_hipocrisia.htm

Sei que esses assuntos de drogas, de mobilização da sociedade é uma coisa muito desagradável e chata. Mas estar bem informado é importante. Estamos travando uma guerra que cada vez invade mais lares: ou nos unimos ou continuaremos chorando nossos mortos e a cada dia mais lágrimas serão derramadas.

Continuo achando que submarino nuclear e jatos sofisticados não poderão ser usados nessa guerra que vivemos. Que tal esses bilhões de dólares que serão gastos serem usados a favor da sociedade. 100 milhões, como falaram, é muito pouco para o tamanho do estrago.


Luiz Fernando Prôa

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

As lições que a caminhada em Copa nos trouxe!

Respondendo ao e-mail de meu amigo Jason Sagara,
sobre como havia sido a caminhada Chega de Hipocrisia!


Foi boa, dentro da realidade que eu já esperava. No pico da concentração, e contando as pessoas conhecidas que passaram para deixar um abraço, acho que umas 80 pessoas. A caminhada partiu com cerca de 50. Claro que não dá para concorrer com o Rio 40º, praia lotada, Maracanã cheio e a indiferença já além da lotação. Confesso que eu mesmo dificilmente iria, o sol estava mais forte que a lua cheia. Mas fui acordado de uma letargia que parece contaminar todos nós, acordado pelo pior dos pesadelos. E não vi outro caminho senão passar a mensagem à frente. Pesadelos deste tipo têm atingido muita gente, bota gente nisso. O que acontece e que me assusta é o crescimento veloz, em aceleração, e cada vez mais incontrolável, dos casos de violência, não só nas grandes cidades como no interior e na fronteira. Esse é um pesadelo que vai invadir a vida de um número cada vez maior de pessoas que, como eu até alguns dias atrás, via a violência pelos veículos da mídia, como se não fosse no meu país, no meu bairro, dentro da minha própria casa.

O mais importante desta caminhada foi saber que demos o grito, que ele aos poucos vai atingindo mais gente e que os órgãos de informação têm sido essências ao ampliá-lo e com isso cumprido sua função social. Peço desculpas aos amigos por não ter conseguido lhes dar a atenção devida, meu foco neste instante é mandar o recado para cada vez mais ouvidos. É necessário que as pessoas pensem sobre seu papel na sociedade e, quem sabe, sensibilizem sua alma e venham nos ajudar.

Havia dito, em uma das cartas que escrevi, que iria caminhar nem que fosse sozinho. Foi bom saber que não estou mais só nessa caminhada. Muitos amigos e poetas apareceram, amigos novos e grupos ou movimentos que lutam por um mundo melhor, além de tevês, jornais e rádios, e não esquecendo de um ingrediente importante, a emoção que demonstrava cada um dos presentes.

A mensagem está circulando. Uma coisa que me tocou muito, e chamou minha atenção, foi a grande teia que se estabeleceu na Internet. Uma imensa corrente humana ligou uma infinidade de redes sociais e a mensagem correu longe. Foi até surpresa receber um torpedo de um xará, o Luiz Fernando, pouco antes de começar a caminhada, que de Londres mandava dizer que estava com a gente com toda a energia de seu ser. Precisamos fortalecer e ampliar essas redes sociais, elas são um instrumento essencial para que nossa voz possa ser ouvida e assim tenhamos o poder de mudar a realidade e ser agentes de nossos destinos. Um quarto poder para fazer com que os outros três não continuem seguindo na contramão de nossos desejos.

Ouvi de tudo naquele dia inclusive relatos muito fortes, outros até gozados. Como o que escutei de um dos amigos, dizendo que teve gente que não veio por que eu era contra o álcool e como gostavam de beber não iam caminhar por isso. Não dá para ser hipócrita, muito menos carregando a bandeira do Chega de Hipocrisia! Também gosto de tomar uma taça de vinho ou uma latinha de cerveja, mas o faço muito raramente, por opção. Nossa luta não é diretamente contra as drogas, mas contra o que as cercam. A violência, o descaso com as vítimas e a falta de uma discussão séria, sem preconceitos ou “viagens” neste assunto tão preocupante que é a guerra que se está travando: onde muito mais gente morre que os números de mortos que as drogas ilegais produzem, onde muito mais gente morre da droga legal, o álcool, do que das ilegais. Alguma coisa está errada, neste caso, e não quero ser o dono da verdade, mas enquanto me derem atenção vou lutar para que este assunto esteja na ordem do dia. As vítimas estão aí, nas ruas, nas comunidades, no trânsito, nos quartéis, no seio da família. É preciso encarar essa situação de frente, com máxima urgência e recursos. Há alguns anos o demônio da inflação foi dominado pelo Real (R$), ajustes foram feitos e a economia deixou de ser doente. Estamos agora precisando cair na real, agir, e domar este demônio muito mais poderoso. O que só depende de nossa ação e de vontade política para isso. A sociedade precisa dessa cura!

Ah, até a poesia apareceu! Poesia de repúdio ao que nossos olhos e mentes captam! Poetas nunca deviam fazer poemas desse tipo! Mas o que fazer? São tempos de guerra aqui no Rio e não é muito diferente da realidade que se vive em que todo nosso país.

Grande abraço, meu mano Sagara, e a todos que lerem este texto. Precisamos de outras caminhadas como essa, mas sem que seja organizada no calor de uma tragédia, e sim fruto da ação coletiva, junto com todos aqueles que não querem mais este demônio, chamado hipocrisia, sentado sobre sua corcunda.


Luiz Fernando Prôa

Convocação para a caminhada em Copa!




Chega de Hipocrisia!

Domingo
Dia 8 de novembro

Caminhada

Do posto 6, Copacabana, em direção ao Leme


- Pela internação compulsória dos usuários de drogas pesadas, legais ou ilegais, que já perderam todos os limites. Criação de unidades terapêuticas humanas e modernas para recebê-los, com acompanhamento especializado que realmente os reabilite. E seguindo critérios de análise, caso a caso, para que não haja abuso deste poder;

- Pelo fim de toda propaganda de bebidas alcoólicas, em qualquer meio. Colocação de advertências educativas nos rótulos dessas bebidas, sobre os prejuízos que podem causar à saúde, como se faz nos maços de cigarros. Proibição daqueles corredores charmosos onde se vende bebida alcoólica nos supermercados e confiná-las onde só possa entrar adultos. Abertura de discussão sobre o aumento da idade permitida para o consumo destas bebidas para 21 anos, como já acontece em outros países, e com fiscalização eficiente.

- Pela alteração das normas que regulam os planos de saúde, para que os doentes mentais e viciados em drogas pesadas possam se tratar, sem limite de tempo.

- Por um amplo debate nacional sobre a política de drogas em nosso país, sem hipocrisia e com os pés no chão, para que se equacione esta questão e vítimas diárias deixem de ser produzidas, enlutando famílias por todo Brasil.

Ou a sociedade avança e discute seriamente seus problemas ou não seremos uma sociedade, mas sim milhões de individualidades, uma nação egoísta.

Chega de Hipocrisia!

Este é Nosso Grito!

Divulguem!

O SILÊNCIO E A INDIFERENÇA SÃO “DROGAS PESADAS” E TAMBÉM MATAM.

Apoios:

“Poetas del Mundo”, “Voluntários da Pátria”, “Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ”, “Rio de Paz”, “Heróis do Cotidiano”, “Projeto de Segurança Ipanema”, “Poemas à Flor da Pele-RS”, “MUNAP-BH”, “Revista Zap”, “Círculo Universal dos Embaixadores da Paz”, “Gabriela, Sou da Paz”, “Movimento de Conscientização da Cidadania”, “UBE-RJ” e individualmente centenas de poetas, artistas das mais diversas artes e grupos, além de cidadãos do bem.

A terceira carta!



"Podemos facilmente perdoar
uma criança que tem medo do escuro;
a real tragédia da vida é quando
os homens têm medo da luz."

Platão


Affonso, obrigado! Fiquei grato e comovido pela publicação de minha carta em seu blog!

Com a tragédia sempre vem a lição, já sabemos disso, mas vejo que esta me direciona para uma missão.

Nos meus primeiros desabafos, sem querer, acabei levantando questões. Coisas que já ruminava interiormente, que afetam muitos, mas que não tinham nenhum destaque. O problema das drogas ilegais já estava aí, em aberto, mal discutido e sem nenhuma solução efetiva por parte das autoridades deste país. Tivemos agora o episódio da gripe suína e todo o país se mobilizou, mas isso é fichinha comparado ao problema do crack e da cocaína. Na questão do cigarro vejo que as medidas são efetivas e estamos evoluindo (ainda não consegui chegar lá, mas vou parar). Mas a discussão do álcool não existe. Ou melhor, existem coisas assim: Se beber não dirija – traduzindo: beba livremente quando não dirigir. Tem gente que só usa táxi, agora!

É neste ponto, o álcool, droga pesada lícita, que acredito ter levantado uma bandeira objetiva. As pessoas estão se drogando cada vez mais e novos consumidores estão sendo treinados ou aliciados, as crianças e adolescentes principalmente. Mesmo com todos sabendo que o álcool vem produzindo milhares de mortes ao longo de décadas, principalmente no trânsito, mas não só nele.

Quando escuto coisas deste tipo: “Tirei ótimas férias, fiquei tomando minha cervejinha na praia”... – traduzindo: fiquei me drogando na praia; “A festa de aniversário (ou o churrasco) estava ótima, cerveja foi o que não faltou”... – traduzindo: droga foi o que não faltou. Sei que outra pessoa ao ler esse trecho vai dizer que estou exagerando, mas as bebidas alcoólicas são drogas que atingem o sistema nervoso e isso não se pode negar. O cigarro também é uma droga, mas que não embriaga.

Estou dizendo isto tudo, como introdução, porque reparei que esta semana, exceto nos programas ao vivo, toda vez que falei das propagandas de bebidas alcoólicas, que deveriam ser proibidas, cortavam essa parte. Da mesma forma quando falava que em outros países o álcool só era permitido para maiores de 21, e que a polícia encarava essa proibição com seriedade, reprimindo-a, também não aparecia. Ainda bem que não falei que deveriam colocar nos rótulos das bebidas fotos de bêbados (drogados) na sarjeta, batendo na mulher, provocando acidentes fatais ou no leito de morte por cirrose. Se falasse, além de não aparecer, corria o risco de apanhar.

Affonso, meu amigo, pessoa a quem bato palmas pela trajetória de vida, eu conheci muita gente nesses 10 anos do Alma de Poeta, mas a grande maioria são pessoas que não tem voz ativa na mídia. Esses amigos, maravilhosos, estão fazendo uma grande corrente, utilizando suas redes de contatos para divulgar a manifestação pacífica que estou convocando para o próximo domingo. Este ato não se restringe a falar do álcool, do crack e demais drogas, mas é um grito contra a falsidade e a desumanidade, “Chega de Hipocrisia!” O poder econômico dos grandes grupos não pode estar acima das pessoas comuns, ditando leis, como essa que oferece 15 dias por ano de internação para drogados e doentes mentais, nos planos de saúde. Muito menos no caso da liberdade da indústria da bebida em seduzir uma legião imensa para suas garras. E o que vemos no dia-a-dia, o poder econômico de grandes grupos influindo na política. Repare que os casos de corrupção nunca acabam, só crescem. Nosso povo não gosta disso, mas a cada eleição é seduzido pela força do dinheiro e acaba elegendo novamente, em grande número, aqueles mesmos que vão meter a mão no seu bolso, que são muito competentes em suas carreiras, mas não conseguem resolver problemas básicos que afligem à população.

Resumindo, o poder econômico, usado de forma criminosa, nos levando a uma sociedade hipócrita.

Gostaria de ver neste dia uma legião de indignados, que não aguenta mais tanto desmando, e também os vários grupos que lutam isoladamente em defesa da sociedade, da ecologia e do bem.

Por isso esta nova carta, dirigida a uma pessoa que tem respeito e reconhecimento público, para que você, meu amigo, possa repassá-la através de sua credibilidade a todos seus contatos que têm alguma voz atuante na sociedade e algum espaço na mídia.

Sei que esta é a luta de um cidadão comum (que teve sua voz ouvida em função de uma desgraça pessoal, que afetou vidas e comoveu o Brasil) contra forças poderosas que impedem a justiça e a verdadeira democracia em nosso país. Sozinho não sou ninguém, mas se este grito se intensificar e nossa sociedade abraçá-lo, poderemos voltar a olhar com bons olhos para o futuro e até sonhar com um país melhor, mais fraterno e humano.

Você, meu poeta querido, está convidado, dia 8, domingo próximo, no posto 6 em Copacabana, com concentração às 14 horas. E o convite, claro, é extensivo a todos que não suportam mais a Hipocrisia que vivemos. Espero ver por lá muitas faixas, cada uma com seu grito próprio. E também que a segurança dos manifestantes seja garantida pela Prefeitura do Rio.

Obrigado por sua atenção!

Abraço, poesia e muita luz,

Luiz Fernando Prôa
www.almadepoeta.com

A segunda carta!

Chega de Hipocrisia! O desabafo do pai do viciado continua!

Caros amigos, os antigos e os que chegaram agora,

Gostaria de agradecer o apoio de todos numa hora tão difícil como esta. Precisou acontecer um fato chocante, um abalo que não atingiu apenas as famílias envolvidas, para que a sociedade se mostrasse perplexa e comovida perante a tragédia diária que vivemos em todos os cantos do país. Não tive tempo para acompanhar nada do que saiu nos noticiários, mas, segundo ouço falar, há um clima de indignação generalizado. O acontecimento lamentável do sábado, dia 24 de outubro (quando meu filho viciado em crack matou a amiga que tentava ajudá-lo a largar as drogas), fez emergir questões difíceis do dia-a-dia, que todos nós enfrentamos e já não aguentamos. Vocês não me verão mais lamentando os eventos que passaram, isso agora fica na minha esfera pessoal. Só me interessa olhar para frente e fazer alguma coisa.

Dentro dessas questões, o crack é uma delas. De uma cracolândia em São Paulo se multiplicaram centenas pelo país. Daqui a um ano serão milhares! A cola de sapateiro foi substituída pela pedra maldita, o consumo disseminado entre todas as classes e o combate intensificado contra o crime organizado transformou o Rio de Janeiro num teatro de guerra, perdida, e que será maquiado para as Olimpíadas de 2016. Mas essa guerra não é só aqui, está espalhada e em expansão por todas as capitais, periferias e áreas pobres principalmente, no interior e nas cidades de fronteira.

O poder público, apesar da boa vontade de alguns setores, se mostra incapaz de deter a marcha vertiginosa das coisas. Há dinheiro para o FMI, para submarino nuclear, para aviões militares sofisticados, para Angra 3 e até para o Haiti, mas o que vemos aqui é a estrutura complemente falida, seja na área da saúde, da segurança pública, na defesa do meio ambiente e em outras áreas.

Não podemos continuar a ser esmagados e acuados pela falta de recursos, pelo poderio de grandes grupos econômicos, como o setor privado de saúde e a poderosa indústria da bebida, que sabemos ser uma droga pesada, apesar de lícita. Dois exemplos são emblemáticos. O primeiro é a aliciação através da propaganda de cervejas e similares sem nenhum controle, em nome da democracia – a deles, é claro – e do direito de informação. Chega a me doer ver atletas se prestando a isso, por dinheiro. A segunda é pessoal. Passando mal na sexta, final da tarde, fui até uma clínica em Laranjeiras, a mesma em que morreu a Cássia Eller, e que agora mudou de nome. Com a emergência aparentemente vazia, duas pessoas apenas na minha frente, esperei no mínimo uma hora e quarenta para ser atendido, ainda tendo que aturar a cara de nojo que a médica plantonista me lançou, quando com educação reclamei com a enfermeira sobre a demora. Mas meu caso não era de emergência, apenas uma dor profunda no coração, um possível enfartezinho qualquer. Saí de lá indignado e me dirigi a outra clínica, com um pique de pressão que poderia ter consequências graves. Por sorte fui atendido prontamente por lá. Isso em plena zona sul do Rio e com um cidadão comum que, naquela semana, havia se tornado assunto corriqueiro até no exterior.

Esta semana foi a pior que já tive na vida! Contudo, houve fatos positivos e que me surpreenderam. A imprensa, muitas vezes criticada, teve um papel importantíssimo neste debate que se desenrolou, cobrando das autoridades ação. A população a “cada esquina” debateu entre si a sua indignação. Os que têm alguma voz na mídia se pronunciaram. E até um pai ousou falar em humanidade.

Por isso me dirijo aos amigos e aos inconformados com este estado de coisas, para agradecer e alertar.

A imprensa e as pessoas comuns seguraram em minhas mãos nestes dias, mas nenhuma autoridade se dirigiu a mim nem me ofereceu qualquer apoio, não sei se por falta de jeito ou com o intuito de não querer ouvir alguém que grita em seu ouvido.

Não posso gritar sozinho. É muito fácil tirar de cena quem aponta o dedo para setores tão poderosos. Mas se formos milhões a gritar, a apontar o dedo, a coisa fica bem diferente.

Alguns gestos que tenho recebido – centenas de e-mails, scraps e depoimentos pelo orkut – têm me comovido: relatos de famílias desesperadas e até uma comunidade no referido orkut chamada Poemas à Flor da Pele, que criou um movimento em apoio a meu grito.

No domingo que vem, dia 8 de novembro, às 14 horas, mesmo que não apareça ninguém, irei caminhar na praia de Copacabana dizendo não à hipocrisia, à falta de ética, ao descaso e à propaganda de bebidas na tevê. O convite está feito, gostaria muito de ver por lá cidadãos decentes e entidades como o Viva Rio, o grupo Basta, membros do Crack Nem Pensar, Movimento pela Ética na Política, ecologistas e quem mais quiser aderir.

Não pretendo me promover nem me candidatar a nada. Estou muito feliz sendo escritor e promotor de cultura na Internet. Tenho certeza de que ninguém gostaria de estar na minha pele neste momento. Mas não vou me omitir. Saí do armário e espero que outros façam o mesmo.

Chega de hipocrisia! Precisamos de ação, paz e um pouco de HUMANIDADE!

Obrigado!

Luiz Fernando Prôa

A primeira carta!

Carta do pai de um viciado em crack que virou criminoso!

Meu filho começou na droga pelo álcool, no colégio, esta droga LEGAL com que a propaganda bombardeia nossas crianças e jovens todo dia, escancaradamente, e que produz milhares de mortes no trânsito, destrói lares, pessoas do bem e, como se sabe, a primeira droga que os jovens experimentam. A maioria segue pela vida em maior ou menor grau se drogando com ela, o álcool, outros acabam provando das ilegais, sendo que uns fogem delas, outros se viciam numa espiral crescente e veloz. Em geral, passam pela maconha, vão na boca adquiri-la e os comerciantes felizes lhes oferecem um variado cardápio, self-service: cocaína, crack, haxixe, êxtase, ácido...

Sei que há seis anos perdi meu filho para o crack, mas apesar das sequelas e problemas, ele nunca deixou de ser carinhoso e educado com todos, o que lhe granjeou um número sempre crescente de amigos.
Ele passou por várias internações - tinha desde pequeno outros problemas mentais que se exacerbaram com as drogas. Sempre que saia, das internações, ficava bem, até encontrar os amigos, tomar umas cervejas e aí a coisa saía novamente de controle. Nestes tempos o vício, apesar de grave, ainda não tinha produzidos todos seus efeitos devastadores. Mas com o tempo e a reincidência o crack foi o devastando. Nos últimos tempos dizia-se derrotado para o vício, vivia muito deprimido e voltara a frequentar o NA, Narcóticos Anônimos. Tentei de tudo para convencê-lo a se internar, mas vai pedir para um pinguço largar sua garrafa, é inútil. Ele foi cada vez mais descendo a ladeira. De mãos atadas fiquei esperando pelo pior ou por um milagre, já que segundo os “especialistas”, que ditam as políticas públicas para o tratamento de drogas, o drogado tem de se internar por vontade própria.

A reportagem que o Brasil assistiu esta semana, da mãe que construiu uma cela em casa, para tentar salvar o filho viciado em crack é bem representativa de como as famílias vítimas deste flagelo estão abandonadas pelo Estado, se virando à própria sorte. E é bem possível que ela seja punida por isso. Na mesma reportagem uma psicóloga inteligente afirmava que o viciado em crack tem de vir voluntariamente para tratamento, este é o método correto, segundo a maioria dos que estão à frente das políticas para esta área. Será que essa profissional é incapaz de entender o estrago que o crack/cocaína ocasiona nas mentes de seus dependentes? Será que ela é capaz de perceber o flagelo que o comportamento desses doentes causam sobre as famílias?

Um drogado, ou adicto, que já perdeu o senso de realidade e o controle sobre sua fissura, torna-se um perigo para a sociedade, infernizando a família, partindo para roubos, prostituição e até assassinatos, por surto ou por droga. Esperar que uma pessoa com a mente destruída por droga pesada vá com seus próprios pés para uma clínica é mera ingenuidade destes profissionais. O Estado tem de intervir nesta questão para preservar as famílias e os inocentes. A internação compulsória para desintoxicação e reabilitação destes doentes, que já perderam todo o limite, é uma necessidade premente. Ou será que todas as famílias que vivem esse problema terão de construir jaulas em casa?

Se meu filho fosse filinho de papai, como falaram, eu já teria pago uma ou mais internações, infelizmente o papai aqui não tem grana para isso, assim como a maioria das famílias vítimas deste, que insisto em reafirmar, flagelo.

Hoje vi uma pessoa boa se transformar num assassino, assim como aquele pai de família correto, que um dia bebe umas redondas, dirige, atropela e mata seis num ponto de ônibus.

As drogas ilegais ou não estão aí nas ruas fazendo suas vítimas diárias, transformando pessoas comuns em monstros e o Estado não pode ficar fingindo que não vê.
Dizem que vão gastar 100 milhões para equipar a polícia, mas e as vítimas diretas das drogas como ficam, os jovens humildes atraídos pelos criminosos para seu exército e os policiais mortos em combate nesta via indireta da guerra do tráfico?
Está na hora de acabar a hipocrisia!

Meu filho destruiu duas famílias, a da jovem e a dele, além de a si próprio. Queria sair do vício, mas não conseguia. Eu queria interná-lo à força e não via meios. Uma jovem, a quem ele amava, queria ajudá-lo e de anjo da guarda virou vítima.

Ele irá pagar pelo que fez, será feita justiça, isso não há dúvida. O arrependimento já o assola, desde que acordou do surto do crack deu-se conta do mal que sua loucura havia lhe levado a praticar. Ele me ligou, esperou a chegada da polícia e se entregou, não fugindo do flagrante. Não passarei a mão na cabeça dele, mas não o abandonarei. Ele cumprirá sua pena de acordo com a lei, dentro da especificidade de sua condição.

Infelizmente, só consegui interná-lo pela via torta da loucura, quando já não havia mais nada a fazer, num surto fatal.

Este é um caso de saúde pública que virou caso de polícia.

Que a família da Bárbara possa um dia perdoar nossa família por este ato imperdoável. Chorei por meu filho 6 anos atrás. Hoje minhas lágrimas vão para esta menina, que tentou por amor e amizade salvar uma alma, sem saber que lutava contra um exército que lucra com a proibição (que não minimiza o problema, pelo contrário, exacerba), por um bando de tecnocratas e suas teorias irreais, e para um Estado que, neste assunto, se mostra incompetente.

Luiz Fernando Prôa
o pai

O debate se inicia!

Caros amigos, iniciarei as postagens com as cartas abertas que escrevi e que circulam na internet, nos jornais, nas rádios e nas tevês, desde que num sábado fatídico (24/10/09) meu filho Bruno, um jovem do bem, mas com problemas mentais exacerbados pelo consumo de drogas (álcool e crack, principalmente) se transformou num criminoso.
O objetivo aqui não é chorar o leite derramado, mas abrir um fórum de discussão onde possamos abordar questões relativas à hipocrisia reinante em nossa sociedade. Seja em relação à falta de uma política de drogas (legais ou ilegais) realista para nosso país ou até mesmo em relação a casos do cotidiano, como o da moça que foi molestada numa universidade por usar um vestido curto - isso no país do carnaval e do culto ao corpo na mídia e nas praias.
O canal está aberto. Espero que possamos contribuir, com informação e denúncias, colaborar para a transformação de nossa sociedade, tornando-a mais humana, e conseguir salvar vidas, já que o silêncio e a indiferença são também “drogas pesadas” e matam.

Chega de Hipocrisia!

Luiz Fernando Prôa